Cuidado com a visão interior

de Robin Hanson*, janeiro de 2007 **

 

 

Em vez de assistir aos fogos de artifício em 4 de julho, eu montei um quebra-cabeça de fogos de artifício de 1500 peças, meu primeiro quebra-cabeça em pelo menos dez anos. Várias vezes eu tive a forte impressão de que eu tinha cuidadosamente eliminado todos os lugares possíveis em que uma peça poderia ir, ou todas as peças possíveis que poderiam ser colocadas em algum lugar. Eu estava muito tentado a concluir que muitas peças estavam faltando, ou que a caixa tinha peças extras de outro quebra-cabeça. Isso não era impossível – o quebra-cabeça era de uma caixa aberta que um parente tinha montado antes. E a alternativa parecia humilhante.

 

Em vez de assistir aos fogos de artifício em 4 de julho, eu montei um quebra-cabeça de fogos de artifício de 1500 peças, meu primeiro quebra-cabeça em pelo menos dez anos. Várias vezes eu tive a forte impressão de que eu tinha cuidadosamente eliminado todos os lugares possíveis em que uma peça poderia ir, ou todas as peças possíveis que poderiam ser colocadas em algum lugar. Eu estava muito tentado a concluir que muitas peças estavam faltando, ou que a caixa tinha peças extras de outro quebra-cabeça. Isso não era impossível – o quebra-cabeça era de uma caixa aberta que um parente tinha montado antes. E a alternativa parecia humilhante.

 

Mas eu permiti que uma parte muito diferente da minha mente, usando considerações diferentes, prevalecesse sobre esse juízo; tantas peças extras ou faltando parecia algo improvável. E, no fim das contas, só faltava uma peça e não havia nenhuma extra. Eu me lembro de uma experiência semelhante quando eu estava aprendendo a programar. Eu checava cuidadosamente meu programa e não encontrava erros, e então, quando meu programa não rodava, eu era tentado a suspeitar de erros de hardware ou de compilação. Claro que o problema era quase sempre minha culpa.

 

A maior parte das maneiras de superar um viés, talvez todas elas, se parecem com isso. Na linguagem do artigo clássico de 93 de Kahneman e Lovallo, nós permitimos que uma visão exterior [outside view] prevaleça sobre uma visão interior [inside view]. De seu artigo:

 

Dois modos distintos de fazer previsões foram aplicados para o mesmo problema nesse incidente. A visão interior do problema é aquela que todos os participantes adotaram. Uma previsão feita a partir da visão interior é gerada se focando no caso em questão, considerando o plano e os obstáculos para a sua finalização, pela construção de cenários de progressos futuros, e extrapolando as tendências atuais. A visão exterior é aquela que nosso expert de currículo foi encorajado a adotar. Ela essencialmente ignora os detalhes do caso em questão, e não envolve nenhuma tentativa de prever detalhadamente a história futura do projeto. Em vez disso, ela se foca em estatística e em uma classe de casos escolhida como similar, em aspectos relevantes, ao caso atual. O caso em questão também é comparado com outros membros da classe, em uma tentativa de avaliar sua posição na distribuição de resultados para a classe. (…)

 

As visões interior e exterior se baseiam em fontes diferentes de informação, e aplicam regras diferentes para o seu uso. (…) Deveria ser óbvio que quando ambos os métodos são aplicados com igual inteligência e talento, a visão exterior tem muito mais chances de fornecer uma estimativa realista. (…) É um erro sério assumir que os resultados dos cenários mais prováveis também são mais prováveis, e que os resultados para os quais nenhum cenário plausível vem à mente são impossíveis. (…) É uma abordagem conservadora, que falha em prever eventos extremos e excepcionais, mas funciona bem com os comuns. (…)

 

Nossa principal observação, que é psicológica: a visão interior é esmagadoramente preferida em previsões intuitivas. A nossa maneira natural de pensar sobre um problema é trazer à mente tudo que se sabe sobre ele, com especial atenção para seus aspectos únicos. O desvio intelectual na direção da estatística de casos relacionados é raramente escolhido espontaneamente. De fato, a relevância da visão exterior é às vezes explicitamente negada: físicos e advogados frequentemente argumentam contra a aplicação de raciocínio estatístico para casos particulares. Nesses casos, a preferência pela visão interior parece quase ter um caráter moral. A visão interior é estimada como uma tentativa séria de lidar com as complexidades do caso único em questão, e a visão exterior é rejeitada por depender de uma analogia grosseira com instâncias superficialmente similares. (…)

 

O contraste entre as visões interior e exterior foi confirmado pela pesquisa sistemática. (…) Um resultado típico é que os voluntários estão corretos em apenas 80% dos casos quando eles se descrevem tendo “99% de certeza”. As pessoas são excessivamente confiantes ao avaliarem a precisão de suas crenças uma de cada vez. É interessante, entretanto, que não há evidência de um viés de confiança excessiva quando se pergunta para os voluntários, depois da sessão, o número de questões para os quais eles escolheram a resposta certa.

 

Se superar os vieses se resumir a fazer uma visão exterior prevalecer sobre uma ‘visão de dentro’, então nossas questões se tornam: quais são as visões exteriores válidas, e o que nos motivará a aplicá-las?

 

 

 

Notas

 

* Robin Hanson é professor de Economia na Universidade George Manson e pesquisador associado do Future of Humanity Institute da Universidade de Oxford.

 

** Texto traduzido por Lucas Machado. Revisado por Lauro Edison.
O original em inglês pode ser lido aqui.